segunda-feira, 24 de maio de 2010

eu sou



eu sou a pessoa

eu sou o animal coberto de lâ

eu sou o meu próprio alimento

eu sou o fundo do túnel

eu sou a luz

eu sou o alçapão sem fundo

eu sou a viagem até às estrelas

eu sou o pastor debaixo da terra

eu sou a fonte fecunda

eu sou o vazio fértil

eu sou a criação já criada

eu sou mil vezes tudo



nada





segunda-feira, 17 de maio de 2010

peito, floresta



a floresta inteira da amazónia

avança sobre o meu peito selvagem


sou índio à beira da catástrofe: vi um coração

maior que o meu

os diques seguram sentimentos de cimento

mas nesse momento desmoronam-se em lágrimas

que produzem uma espécie de electricidade amorosa


cai chuva e são pétalas cor de rosa


toda a civilização que tenho armada sobre o corpo

está ameaçada

são vias de extinção sou eu

em frente à minha derrocada

és Tu coisa que vi

a mandar-me encostar, sair da viatura

e começar a vida toda de novo




sábado, 8 de maio de 2010

a pantera de rilke




o fotógrafo capta uma imagem em negativo

o fotógrafo entra no quarto escuro

as mãos mergulham nos líquidos

os líquidos trabalham no escuro

a imagem revela-se

o negativo transforma-se em positivo


que palavra sou eu?


em cima, um fluxo de energia circula num reservatório, à espera

em baixo, uma pantera negra roda sobre si

espreitando por entre barras negras


que palavra sou eu?


no intervalo dos negros abre-se uma comporta

e a luz muda de nível

a energia transforma-se em massa, forma

a mão do escritor aparece dentro do coração

negro da pantera:

o olho do fotógrafo

implanta-se na espiral dos dedos


que palavra sou eu?


o olho, a mão e o coração

os níveis fundem-se e a realidade completa-se


a energia flui, a escrita fixa, a alma revela-se e o Ser respira

cumpre-se a si próprio


Eu sou.





terça-feira, 4 de maio de 2010

segredo



envio cartas a mim próprio

faço jogos de espelhos infantis

o que é viver ? pergunto sem medo

mas não ouço resposta

a não ser o risinho discreto

de O amor ele próprio em carne e osso

a mostrar-se sem pudor

mesmo à frente dos meus olhos ainda tímidos

de tanto mastigar em segredo